

Estávamos terminando a fase de visita às vinícolas da África do Sul e de última hora decidimos ver o Atlético Mineiro, nosso time de coração, disputar o mundial de clubes, em Marrakech, Marrocos. Este país, não estava em nossa rota do nosso projeto Wine World Adventure. Mas, a saudade dos amigos de Belo Horizonte e a sensação de encontrar muita gente conhecida, bateu mais forte.
Por incrível que pareça não existe voo direto de Cape Town ou Jonnesburgo para Marrocos. Tivemos que pegar um voo para Paris e retornar ao norte da África e aterrissar, em Casablanca. Depois de uma maratona cansativa, chegamos ao aeroporto de Casablanca e de taxi percorremos 250 km em um asfalto impecável, de paisagem exótica e desértica de terras vermelhas e esparsas casas vermelhas, pelo caminho. Cansados chegamos à cidade vermelha, uma das quatro cidades imperiais de Marrocos, declarada “Patrimônio Mundial” pela UNESCO.
Chegamos, dia 11 de dezembro, um dia depois da gloriosa equipe do Galo ter desembarcada, no Marrocos, para aclimatizar-se e preparar para a estreia dia 17. Fomos os primeiros da imensa torcida, estimada em 15.000 que estava para chegar. As ruas decoradas com painéis anunciando a copa estavam espalhadas pelas principais ruas da cidade vermelha que parecia alheia à importância imaginada por nós, deste evento.
Nos primeiros dias, parecia que os marroquinos não estavam nem aí. Concluímos erradamente que eles não torceriam pelo time convidado a participar do mundial, o Raja Casablanca. Devem ser inimigos como o são Galo e Cruzeiro.
A partir do dia 15 a cidade começou a fervilhar de atleticanos que surgiam na porta dos majestosos e faraônicos Hotéis e Riads, espalhados pela área nova da cidade, bairro de Guéliz, onde a cidade pulsa com excelentes lojas de grifes internacionais, ótimos e típicos restaurantes, que apresentam em seu cardápio a curiosa e excêntrica cozinha marroquina. E para que se assusta com os targines marroquinos podem optar pela comida francesa, influenciada por anos de colonização da França, que também influenciam nos vinhos de Marrocos, que apresenta poucos rótulos de boa qualidade. Como buscar uma agulha no palheiro, descobrimos um rótulo de um tinto, Syrah, que surpreendeu pela sua complexidade e qualidade, o Tandem. Um vinho da Terra do Sol Poente, que mostra em seu corpo este calor diurno e frio noturno, oriundo do deserto, que amadurece bem a uva. Um vinho que surpreendeu.
Enquanto aguardávamos a data de estreia do Galo, aproveitamos para conhecer a exótica Medina, cidade antiga cercada por uma grande muralhada avermelhada que funciona como centro comercial e residencial, uma mesquita central, palácio real e os suqs (mercados), que de início assusta os menos avisados. De início, um clima de insegurança é latente percebida logo que se ultrapassa a porta central da muralha, edificada para proteger das diversas invasões ocorridas durante sua história, devido à posição estratégica de Marrocos, vizinho da Europa, separada por dois mares, pelo estreito de Gilbatrar).
Nove portas grandiosas, chamadas em árabe de babs, cada qual com quatro grandes torres, dão acesso à velha cidade (Medina).
Logo ao atravessar o portão principal da muralha, surge a exótica e curiosa praça Dejemaa el Fna. O primeiro impacto é de insegurança total, um mergulho claustrofóbico, com as impertinentes e abordagens constantes sobre os turistas, realizadas pelos encantadores de cobras ou adestradores de macacos que exigem um Dinar para tirar uma foto.
No centro da praça Djemaa El Fna, um mercado montado numa praça circular no centro de Marrakech, fervilha com centenas de feirantes e negociantes, com suas barracas repletas de especiarias, frutos secos, laranjas e comida típica em um grande encontro entre os locais e centenas de turistas de todo o mundo, espantados com as motos que cruzam em zigue-zague ou pela presença de carros e charretes, em um desorganizado trânsito, sem leis, mas uma ordem aparente, onde eles mesmos se desfazem da confusão, sem nenhum acidente, que pode ser observada tomando café em um dos terraços dos Cafés-restaurantes que circulam esta praça.
Uma loucura, vista de cima. Mas, há muito coisa curiosa para se ver, penetrando no bairro, pelas ruelas estreitas repletas de pessoas locais, turistas andando e desviando das motos que surgem em cada esquina, disputando espaço com carroças, jegues e vendedores ambulantes e barracas e lojinhas de artesanatos ou de produtos típicos, como tapetes, bijouterias, obras de arte, etc. Estar neste mercado a céu aberto e perambular pelas infinitas ruelas sem saídas da Medina é relembrar as cenas do filme: O Homem que sabia demais de Alfred Hitchock.
Deixamos para entrar nas ruelas para o segundo dia. Necessitávamos conhecer onde estávamos para adquirir coragem e penetrar no coração da Medina, seguindo a frase de Fernando Pessoa: “Primeiro estranha-se, depois entranha-se”. Tendo como sentinela principal a torre (mirante) da mesquita Koutobia.
E seguindo esta orientação deste especial escritor brasileiro, circulamos pelas ruelas durante três dias, vagueando pelos Souqs (mercados de Medina) adjacentes à Djemmaa El Fna, comprando alguns produtos típicos ou parando em alguns monumentos como a Madraça de Bem Youssef, uma antiga escola, repleta de quartos de tão pequenos e escuros, que remete a uma prisão. Estranho e curioso. Outra visita imperdível é o Palácio de El Bahia que mostra o estilo de vida de um nobre marroquino, do século XIX.
O confronto entre a pobreza e a riqueza se encontra no lado externo da Medina, logo na entrada está o Hotel La Mamounia, faraônico, um 6 estrelas, com três restaurantes espetaculares, caríssimo. Estar involucrado nele é viver 1001 noites nas arábias. Em um jantar espetacular harmonizamos o melhor tinto do Marrocos, o Syrah da vinícola Tandem com um cordeiro. Divino. Uma noite para escrever nas estrelas…
Um dia antes do Galo entrar em campo, munidos de short e tênis os três aventureiros do vinho acompanhados pelo João Vitor Haddad, atleticano fanático, corremos pelas belas e bem traçadas ruas do Bairro nobre de Guéliz até o Jardim Majorelle, localizado no coração da Ville Nouvelle de Marrakech. Após, exaustos pelas corridas descansamos em um banco logo na entrada deste jardim – uma reserva natural de cactos dos cinco continentes, bambus, boungaviles e outras plantas exóticas envolvidas em uma casa azul-anil, restaurada por Yves Saint-Laurent, que aproveitou a paz do local para realizar suas criações. De acordo com seu desejo suas cinzas foram espalhadas pelos jardins após sua morte em 2008.
Dia 16, a cidade acordou com um grito geral: Galooooooo e com tímidos gritos de Rajaaaaa. A cidade fervia de atleticanos fanáticos por todos os lados. A Medina que antes respirava mofo de tapetes e especiarias passou a respirar as cores pretas e brancas. Uma festa, que terminou com a inesperada vitória do time da casa por 3 a 1.
Mesmo assim os gritos de Galoooo continuaram, cantados inclusive pelos simpáticos e amáveis vencedores que se misturaram carinhosamente com a massa atleticana. Muitos taxistas e torcedores, munidos de bonés e cachecóis brindados pelos brasileiros, gritavam o nome do nosso maior astro, Ronaldinho ou entoavam o coro: “Chupa Mariaaaaa”. Uma festa que somente o futebol pode unir povos de culturas extremamente diversas. Voltaremos no próximo ano para dar o troco e se não for possível entender com mais propriedade a cultura local.